5 de abril de 2021, Mariela Carrasco

Acompanhamento à morte e luto em tempos de COVID-19

A morte, além de ser um conceito puramente biológico, também possui uma forte dimensão simbólica ligada a fenômenos socioculturais, o que acaba se tornando uma experiência única e singular.

A morte, além de ser um conceito puramente biológico, também possui uma forte dimensão simbólica ligada a fenômenos socioculturais, o que acaba se tornando uma experiência única e singular. Essa concepção da morte, junto com o tratamento dela e os processos de luto, tem se transformado ao longo dos anos em função do momento histórico e dos acontecimentos ocorridos.
Morte e luto, temas tabus? Atualmente, a morte e o luto são considerados temas tabus na sociedade ocidental, em parte porque os indivíduos não estão suficientemente preparados nem educados em relação aos processos que envolvem a perda de um ente querido. Da mesma forma, o aumento da esperança de vida e os avanços biomédicos dos últimos anos geraram um sentimento de imortalidade não real, fazendo com que a sociedade não seja consciente da finitude humana e, por conseguinte, a morte chegue de forma desprevenida. Os milhares de pessoas que perderam a vida sob circunstâncias atípicas e extraordinárias durante os últimos meses como consequência da pandemia de coronavírus levaram profissionais de diferentes áreas a refletirem sobre a morte e o luto. Uma delas foi a educadora social Jana Mercadal, ganhadora do Prêmio ISEP pelo Melhor Trabalho de Final de Graduação (TFG), que aproveitou a oportunidade para realizar um trabalho de aproximação aos processos de morte e luto e seus acompanhamentos desde uma perspectiva social. Dessa forma, graças à pesquisa etnográfica realizada por Jana Mercadal, que se concentra na análise das percepções, experiências e emoções tanto de profissionais socio-sanitários quanto de pessoas que nos últimos meses viveram de perto o falecimento de um ente querido, ficou evidente como a “morte velada” se instaurou na sociedade.
O fato de ser uma sociedade pouco acostumada a catástrofes como o Coronavírus e tendendo a delegar a morte e a doença a um sistema biomédico que se viu sobrecarregado, fez com que a cidadania se descobrisse frágil e vulnerável diante da ideia de finitude humana. Assim, a morte acabou se tornando, por um lado, para todos aqueles considerados vulneráveis (pessoas idosas e/ou com patologias de risco prévias) como uma espécie de loteria inversa; enquanto, por outro lado, para os mais jovens e saudáveis, a morte foi vista apenas como uma limitação à sua liberdade.
Medo de contágio e medo da solidão Independentemente da vulnerabilidade de cada indivíduo, os sentimentos mais comuns têm sido o medo de contágio e o medo da solidão. No caso do medo de contágio, a sociedade se viu obrigada a se adaptar a uma nova realidade marcada pelos protocolos e medidas de segurança do Coronavírus que foram implementados nos últimos meses. Da mesma forma, o medo de contágio fez com que muitas pessoas falecessem sozinhas, sem acompanhamento familiar ou profissional. Por sua vez, o medo da solidão se transformou em uma espécie de sentimento de auto-sacrifício para muitos doentes durante a pandemia do COVID-19, entendendo-o como a melhor maneira de salvaguardar os entes queridos de um possível contágio. O desejo de acompanhamento das pessoas em estado paliativo se tornou a necessidade principal não só dos doentes, mas também de seus familiares. Infelizmente, os profissionais de saúde, que também desempenham um papel fundamental nesses processos, não puderam assumir essa função ou, quando o fizeram, não foi nas melhores condições.
A grande pressão que os profissionais sofreram, junto com a priorização de tarefas e a falta de tempo, provocou uma redução na atenção e no acompanhamento dos pacientes. Assim, o isolamento se tornou a medida preventiva mais complexa de gerir, pois não permitiu acompanhar os entes queridos em seus últimos momentos de vida, despedir-se deles ou realizar os habituais rituais de despedida. Com isso, surgiram certas dificuldades para assimilar a perda, tornando-se para muitos uma experiência traumática.
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